(...) sapatilha



Eu nunca fui de dar grandes problemas aos meus pais. Lembro-me de ter o hábito de tirar os sapatos todos do armário à minha mãe e neles imaginar o mundo adulto.
O meu pai era e continua a ser um homem de muitas regras, quando ele estava não havia espaço/tempo para disparates. Bastava-lhe uma única expressão e eu punha-me logo em sentido.
A escola nunca foi de todo a minha paixão, era mais uma obrigação.
Das aulas eu não "pescava" nada, passava a vida a desenhar ou a conversar. Até ao dia em que a professora de Inglês (a popota como nós sempre lhe chamamos) se cansou de me ver virada para trás na carteira e me escreveu um recado na caderneta.
Não quis que a minha mãe (na altura a minha encarregada de educação), visse esse recado e então fiz a maior asneira até ao dia de hoje. Falsifiquei a assinatura dela e no dia a seguir apresentei-o à professora. Não desconfiou de nada, lembro-me de pensar "ufa desta já me safei".
Duas ou três semanas a seguir o meu Diretor de Turma, pediu-nos que escrevesse uma informação na caderneta aos pais. No mesmo dia, apresentei-o à minha mãe. Tinha tudo para correr mal e correu. A minha mãe percebeu o que eu tinha feito. Não me lembro das palavras que me disse, mas lembro-me que pegou num par de sapatilhas (na altura as minhas favoritas) e deu-me com elas até perder as forças. Conseguia-lhe ver no olhar a tristeza/raiva com que me batia, não eram de todo aqueles os valores que ela me tinha passado. 
Para não bastar as marcas no rabo, a minha mãe, no dia seguinte, apresentou-se na escola para contar ao meu diretor aquilo que eu tinha feito.
Até o ano terminar eu nunca mais consegui olhar aquele homem na cara de tal vergonha que eu sentia. E as sapatilhas que mais gostava, essas? Eu nunca mais as usei.

Crie o seu site grátis! Este site foi criado com a Webnode. Crie o seu gratuitamente agora! Comece agora